domingo, 2 de agosto de 2015

Parque do Zizo, o retorno

Ave amigos!

O Parque do Zizo é uma RPPN criada pelos irmãos do Zizo, militante morto pela ditadura. Uma história muito bonita, comovente, de amor à natureza(convido todos a visitar o site e conhecer melhor esta grande história:http://parquedozizo.com.br/wp/).
O Chico, irmão do Zizo, é um ex-caçador que virou ferrenho defensor da natureza e está a frente deste nobre projeto que conta com a ajuda de outros membros de sua numerosa família.

Marcelo, o irmão caçula, conheci neste retorno. Ele é o atual responsável pela cozinha e aproveito o ensejo para parabenizá-lo mais uma vez, uma das comidas mais deliciosas que já experimentei. Além de excelente "chef", o Marcelo é um sujeito sensacional! Assim como o Chico, é gente nossa!

O grande chef Marcelo preparando nosso desjejum na cozinha do Zizo

Bem, antes de continuar, vou contar pra vocês uma história rápida, de como minha ansiedade me deu uma sorte danada.
Esta viagem foi programada com muita antecedência e já há alguns anos venho sonhando com o Parque do Zizo. Naturalmente acordei muito mais cedo que o despertador e cheguei cedo ao aeroporto, afinal mineiro num perde nem trem, quanto mais 'vião!
No check-in me ofereceram um voo uma hora mais cedo, que aceitei.
Quando acabo de desembarcar em Congonhas, a Infraero informa que o Santos Dumont(o aeroporto que peguei o voo) estava fechado por motivos meteorológicos!

São Pedro, mais uma vez muito obrigado!

O grande Paulo Batista e seu filho, o Gabriel, estavam me esperando no aeroporto. Conheci o Paulo e o Gabriel no Zizo mesmo, há quatro anos, e após uma saída com a gente, o Paulo virou passarinheiro de mão cheia e o Gabriel nem se fala, tem talento pra coisa!

Fomos para Campinas, onde encontramos com o Geiser e seu pai, o Sr. Ari, gente fina demais! E dali partimos para nosso tão aguardado destino.

Antes mesmo de chegar ao Zizo, num eucaliptal, tive a sorte de encontrar um gavião-de-sobre-branco pousado, espécie rara e bela de acipitrídeo que até então só havia encontrado voando alto, no próprio Parque do Zizo, das primeiras vezes que lá estive.

Gavião-de-sobre-branco
 Não só eu, mas todos começamos com o pé direito

Assim que adentramos em áreas do Parque, numa área mais aberta, relativamente pouco explorada, o Geiser já mostrou pra que veio.

Aviso! O paraíso começa aqui e é intocável

Como sempre, fiz uma lista de lifers após pesquisa no Wikiaves e na Taxeus, e enviei pro Geiser. Assim que chegamos neste lugar, o Geiser já falou que o local era promissor para a esquiva choquinha-carijó, belo exemplar de uma das minhas famílias favoritas.

Surpreendentemente não demorou muito pra ela se expor e dar um mole danado

Continuamos adentrando aquele paraíso e a emoção de voltar àquele lugar aumentava a cada cenário de sonhos que se descortinava, a cada curva, a cada lembrança.



Estava tudo lá, as imponentes árvores ornadas de bromélias, epífitas, líquens e afins, os belos samambaiuçus, o imponente som do corocochó, o mirante dos Gavião, o pórtico depois da ponte sobre o rio Ouro Fino...

Naquele momento agradeci a Deus a oportunidade de retornar e ao Chico, por cuidar, manter e nos receber no sensacional Parque do Zizo.

Mirante dos Gavião, Mata Atlântica até perder de vista


Agradeço ao grande Gabriel pelos meus registros no Zizo


Com muita alegria fomos recebidos na sede pelo grande Chico, que logo nos apresentou ao não menos nobre Marcelo, irmão caçula do Zizo.

Outro que também nos recebeu e que pudemos desfrutar de sua companhia todos os dias, o dia inteiro, foi este simpático e acrobático pula-pula-ribeirinho.

Nosso amiguinho emplumado

Após quase quatro anos, enfim matei uma grande saudade.
O Parque do Zizo foi um lugar muito especial pra mim pois foi meu primeiro grande destino como fotógrafo de aves.

À esquerda os alojamentos, à direita a cozinha e o almoxarifado, e em primeiro plano uma cara de felicidade


Bem, para quem ainda não conhece, o Parque do Zizo é uma RPPN incrustada no maior remanescente de Mata Atlântica.  A sede é cercada de mata primária e você não precisa sequer sair dela para encontrar aves fantásticas. Só para vocês terem uma ideia, da sede já foram vistos gavião-de-penacho, jacutinga, pica-pau-de-cara-canela, caburé-acanelado e até um provável uiraçu-falso!
Nesta viagem fiz 7 lifers na área da sede, o arapaçu-escamado-do-sul, o picapauzinho-verde-carijó, o bem-te-vi-pequeno, o piolhinho-chiador, a maria-pequena e os festejados papa-formiga-de-grota e falcão-relógio.

E o que dizer do comedouro? Aproveite o inverno pois é a alta temporada dele.

O muito bem frequentado comedouro do Parque do Zizo

O belíssimo e esquivo sabiá-coleira 

O comedouro do Parque do Zizo é uma atração à parte, ótima opção de sesta(afinal, quem vai dormir num lugar desses) e de quando a famosa garoa inverna no Parque.

A espécie que eu mais queria fotografar no comedouro era o sabiá-coleira, pra mim o sabiá mais bonito do Brasil, espécie florestal e arisca, nada fácil de fotografar. No período que fotografamos no comedouro este sabiá foi uma única vez e só por alguns instantes, mas o suficiente para fazer registros à altura de sua beleza.

Alguns outros registros propiciados pelo comedouro:

Tietinga

Catirumbava e sanhaçu-de-encontro-azul
Tecelão


O Parque do Zizo ainda conta com 35 km de trilhas, onde já foram registradas, em armadilhas fotográficas, antas, catetos, jaguatiricas, onças-pardas e até uma onça-pintada.

Fizemos uma pequena parte delas, onde registramos aves raras e ameaçadas, sendo seis lifers(papo-branco, gavião-miudinho, chocão-carijó, tovaca-campainha, limpa-folha-ocráceo e andorinhão-de-sobre-cinzento), mesmo não estando numa época boa, pois no inverno as aves vocalizam pouco e a maioria não responde bem ao playback.

A tovaca-campainha e o papo-branco foram registrados a poucos metros da sede, no acesso à trilha dos passarinheiros. Encontrar o papo-branco tão próximo da sede surpreendeu até nosso experiente guia.

Ambas espécies são muito difíceis de fotografar e particularmente tenho uma história com elas.

A tovaca-campainha devo também ao Gabriel, que com seu talento inato descobriu a ave empoleirada e o papo-branco devo ao Geiser, que não desistiu e até se arriscou para que eu conseguisse o registro.

O ameaçado papo-branco ou choca-da-taquara, em seu habitat
Único momento propício em dois dias de tentativas

O belo corocochó, que junto com o tropeiro-da-serra, domina a paisagem sonora do Parque
Barbudo-rajado secando as penas na sede do Parque
Papa-formiga-de-grota, apesar de abundante, este foi o único momento que colaborou um pouco para fotos

No meio da trilha e a um palmo do chão, o belíssimo tangará dançarino

Bico assovelado, mais uma ave intrigante do time das nada fáceis de fotografar

Dos vários lifers muito especiais, o do raro gavião-miudinho se destacou.

Estávamos chegando ao mirante dos Gavião, com a intenção de aproveitar o dia de sol para registrar as aves de rapina que costumam pegar as térmicas das últimas horas da manhã, quando o Geiser nos alertou que havia um gavião pousado no mirante!

Quando bati o olho pensei que fosse um gavião-carijó, que apesar de não ser o habitat, já foi registrado próximo à sede. Mas quando vi pela lente, percebi que não se tratava do carijó e aí a adrenalina rolou solta: caraca, é um gavião florestal!!!

Após alguns clicks o bicho nos sobrevoou, sumindo na mata densa.

Na hora, o Geiser identificou como sendo o gavião-miúdo e eu até concordei, mas depois, pensando melhor, lembrei que não teria como ter confundido o gavião-miúdo com o gavião-carijó, os shapes são muito diferentes, o Accipiter striatus é muito mais delgado, cauda longa e a cabeça não é arredondada. Então só me restou o A. superciliosus, que também não possui os calções escuros. Tentei chegar a um consenso, mas retornamos para nossas casas sem um.

Depois, confirmei com o grande especialista Pallinger e o Geiser também, depois de ver a foto no computador, confirmou. Um tempero a mais para um super lifer!
A distância e as duras sombras de um dia de sol dificultaram uma imediata identificação

Nesta nossa última manhã ainda fiz um lifer muito legal no mirante, o chocão-carijó, e ainda encontramos o lindo gavião-pombo-grande e o raro gavião-de-sobre-branco. Só faltou o gavião-pato para fecharmos com chave de ouro o mirante. Fica pra próxima!


"Ave de copa" e difícil de fotografar, o chocão-carijó foi registrado à altura dos olhos devido á topografia do lugar





O sonho de liberdade do Zizo tornou-se maravilhosa realidade, cujos frutos se perpetuaram na forma de uma Reserva do Patrimônio Natural. Reserva esta que está disponível para todos aqueles que procuram paz e contato íntimo com a natureza.

Estar num local como esses é um verdadeiro privilégio, é estar em um mundo perdido, criticamente ameaçado de extinção, que tem o poder de renovar nossas forças e a esperança de que o futuro não é tão sombrio quanto parece.

Geiser, Marcelo, Chico, Gabriel e Paulo Batista
Muito obrigado amigos!

Para quem quiser conhecer e admirar mais da natureza do Parque do Zizo, sugiro o ótimo livro sobre a Mata Atlântica do excelente fotógrafo Octávio Campos Salles: http://kaaete.com.br/ que capturou cenas fantásticas da flora e da fauna do Parque, além de contar com um texto realmente interessante, educativo e enriquecedor.

Mais fotos minhas de todas as viagens que já fiz ao Zizo podem ser acessadas aqui: https://www.flickr.com/photos/joaosouza/sets/72157626663345495

Grande abraço e até a próxima meus amigos!